quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Melhores livros de 2015


Por Júlia Martins

Como boa leitora e seguidora de alguns blogs, revistas e sites, adoro as listas de final de ano com os melhores livros. Por isso, vou fazer a minha também. Para a seleção, consultei minhas anotações feitas durante o ano, nas quais atribuo uma pontuação subjetiva dos livros que li. 

Este ano li 39 livros e aqui faço um parêntesis: A mão esquerda da escuridão, de Ursula Le Guin, é o responsável por eu não arredondar para o número botininho e imponente dos 40, pois estou tendo dificuldades para ler esse livro sem tirar sérios cochilos num panorama máximo de dez páginas. 

Lembrando que não são livros publicados neste ano, mas os livros que eu li. Na minha lista tem oito livros que dei nota máxima, e selecionei mais dois que bateram na trave, fechando os dez melhores de 2015:

10) A primeira história do mundo - Alberto Mussa
Essa já tem resenha no site, olha aqui!

9) A vítima silenciosa - Otto Lara Resende
Um livro que parece minha avó contando suas memórias de infância num interior bucólico, onde a simplicidade da vida e a inocência da criança que narra tornam esse livro apaixonante e delicado.

8) Cartas extraordinárias - Shaun Usher (Organização)
O nome diz tudo, cartas extraordinárias de histórias que encantam, fascinam, assustam, rememoram, ensinam, emocionam, alegram, entristecem, enfim, é um livro que nos traz um pouco de tudo em forma de cartas.

7) Do inferno - Alan Moore
Depois que li esse livro, virei fã de Alan Moore. Uma retomada histórica excepcional e um belo trabalho ficcional nas lacunas, vejam meus comentários neste post!

6) As Coisas - Georges Perec
Também escrevi sobre esse livro atualíssimo do francês Georges Perec aqui!

5) Três Sombras - Ciryl Pedrosa
Do meu ponto de vista, essa história é uma parábola linda sobre a inevitabilidade das perdas. Um dos melhores quadrinhos que já li, se não for o melhor.

4) Do amor e outros demônios - Gabriel Garcia Marquez
Gabriel Garcia Marquez é sempre certeza de boa leitura, minhas impressões ficaram registradas neste post!

3) Meus documentos - Alejandro Zambra
Li esse livro durante minha viagem ao Chile e foi uma das melhores experiências que já tive com leitura, já que o livro do Zambra quase todo se passa pelos ambientes do país, no qual se torna ele também um personagem. São contos que contam histórias que parecem ser de amigos e familiares.

2) Equador - Miguel Souza Tavares
Definitivamente uma história muito bem contada, para aqueles que amam ler e para os que não amam também, de não querer largar o livro. Vejam aqui!

1) O sol é para todos - Harper Lee
Com certeza um dos melhores livros que já li, não sei por que não fiz resenha, mas acho que é difícil descrever um livro quando criamos uma ligação com ele. Uma história para refletir sobre a crueldade dos preconceitos.

Faço também menção honrosa para: O brilho do amanhã, de Ishmael Beah; Lina Meruane com seu Sangue no olho; e Oblómov de Ivan Gontcharov. Foi difícil deixar eles de fora da lista.

Bem, essa é a minha lista, e qual é a sua?

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Asterios Polyp: mais um da nona arte



Por Júlia Martins


Para mim, Asterios Polyp não é um livro de quadrinhos, é uma obra de arte. Não sou a maior conhecedora de quadrinhos, embora nunca tivesse lido, ou visto, algo tão surpreendente e elaborado no que diz respeito ao desenho/traço.

Paleta de cores diferenciada (Fonte: NY Times)
David Mazzucchelli, autor dessa linda obra, trabalha tantos traços, formatos, cores que a obra transborda em beleza e inovação. A história também é muito bem contada: o protagonista, Asterios Polyp, um arquiteto de sucesso, relembra sua vida em meio a pesadelos com um irmão gêmeo natimorto. Um incêndio em seu apartamento o faz largar tudo.

A verdade é que eu nem tenho conhecimento para descrever a arte que nos é apresentada, mas posso garantir que foi uma experiência muito diferenciada esteticamente, sem deixar de lado a delicadeza das relações humanas que são tratadas no livro. É maravilhoso.

O brilho da literatura africana



Por Júlia Martins
Mais uma vez me encanto com um escritor africano. Eu, que já sou fã de carteirinha de Mia Couto, Ondjaki, Coetzee, entre outros, li a obra mais recente do ex-menino soldado de Serra Leoa, Ishmael Beah, intitulada O brilho do amanhã (que nome lindo, não é?).

Este livro, uma ficção, ao contrário do primeiro do autor, uma autobiografia, conta como é a vida após a guerra em um país que foi completamente devastado. Desde o desafio de retornar à terra natal, enterrar os restos mortais de seus familiares, amigos e vizinhos sem nem saber qual corpo pertence a quem, até restabelecer uma comunidade, aprender a confiar nos outros, retomar tradições e, enfim, tentar viver sem as sombras do passado.

Esse parece um caminho acolhedor, tranquilizador e, até dado momento da história, é realmente possível acreditar que o povo é capaz de se reerguer. Contudo, outras autoridades e disputas de poder logo aparecem para desestabilizar esse sistema tão fragilmente construído. Governantes e outras autoridades corruptas, grandes empresas de exploração mineral sem escrúpulos ou respeito pelo povo local são responsáveis pelo reaparecimento da violência, jogando abaixo os sonhos e a esperança desse povo tão sofrido.

Ishmael Beah (Foto: stone-thrower.com)
Permeando a história, está a presença dos anciãos da comunidade com sua tradição de contação de histórias e lendas passadas, principalmente, de mãe para filha, trazendo um tom delicado e esperançoso para o enredo e para nós leitores. Aí está o brilho do amanhã que devemos acreditar.

Beah consegue construir personagens diversos que representam boa parte das pessoas atingidas pela guerra, desde mutilados, pessoas que perderam toda a família, pessoas que se esconderam e viveram longe da sociedade por anos e, enfim, meninos e jovens soldados que tem que lidar com o remorso e a dor de seus próprios atos durante a guerra.

Sabendo do passado do escritor, é possível imaginar que ele coloque no papel um pouco desses sentimentos que teve que aprender a lidar para poder viver consigo mesmo, o que torna o relato sincero, cru e pulsante. Não há nenhum momento onde ele tente justificar ou suavizar a vida dessas pessoas, não há perdão, apenas se aprende a viver novamente.


Um livro excelente para quem ainda não conhece a literatura africana contemporânea, pois apresenta a crueldade da realidade da guerra civil, ao mesmo tempo em que nos introduz ao mundo das tradições locais, das fábulas e lendas do povo e do tom poético com que a própria língua local pincela a escrita.

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Conhecendo Jorge de Lima



Por Júlia Martins
Calunga, de Jorge de Lima, é considerado um dos pilares da literatura nordestina, juntamente com O Quinze, de Rachel de Queiroz, e Vidas Secas, de Graciliano Ramos. Como já havia me aventurado nesses outros dois romances e são alguns dos meus livros preferidos, fiquei muito interessada na obra prima desse escritor alagoano menos conhecido, recentemente editado pela Cosac Naify.

A obra conta a história de um rapaz, Lula Bernardo, que abandona sua cidade natal no interior nordestino para buscar uma vida melhor e estudar na capital. O romance começa com o retorno do personagem à sua terra em busca de sua família, além do objetivo de trazer ao seu povo um pouco do aprendizado adquirido, de forma a melhorar a vida de todos.
De início, para mostrar que o aspecto árido e cruel não está presente apenas na paisagem local, ele não consegue mais localizar sua família que provavelmente foi se acabando à medida que a pobreza invadiu e se apossou de tudo, nesse lugar onde até a esperança não tem espaço.

Ainda com a força de vontade embalada pelos aprendizados e oportunidades que teve na capital, Lula Bernardo decide se estabelecer nas terras onde uma vez morou. Ele passa então a criar cabras, coisa que não se via na região, dominada pela criação de porcos e por um senhor de terras paralítico chamado Totô de Canindé, um verdadeiro coronel na região. Além das dificuldades naturais, ele começa a perceber que seu vizinho de terras não tem as melhores intenções, apesar de parecer um senhor inofensivo e prestativo.

Seca e fome presentes no livro.  (Foto: diário do nordeste.verdesmares)
À medida que Lula começa a se envolver com os locais e buscar soluções aos seus problemas, ele vai se tornando novamente uma pessoa da terra, atingido pela maleita (malária) e se vendo na necessidade de comer terra para aliviar os sintomas. Ele também percebe que não há escapatória, não há como mudar aquele povo, apenas se tornar mais um.

Com inimigos sociais, ambientais e a saúde fragilizada, o fim derradeiro de Lula parece se aproximar. Jorge de Lima sabe ambientar muito bem esse clima confuso e onírico. Nesse espiral de acontecimentos, que o nome do livro mesmo representa (dentre os significados de Calunga, um é redemoinho de água), o escritor não apenas apresenta o destino inevitável de seu personagem, como o de todo o povo nordestino.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Consciência crítica através do humor



Put some farofa, de Gregório Duvivier, reúne uma coletânea de textos que o autor escreveu para sua coluna na Folha de S. Paulo, esquetes para o canal humorístico Porta dos Fundos, além de escritos inéditos. A veia humorística está presente em todo o livro, bem como a crítica social e lições de vida, a exemplo do sobrinho do autor que aos cinco anos, com a perspectiva de pedir qualquer coisa ao Papai Noel, optou por um empadão.

A crônica que dá título ao livro teve grande repercussão na internet, até internacionalmente, retrata a situação do país no momento de sediar a Copa do Mundo, em 2014. Muita bagunça e costumes peculiares refletiam nossa condição frente aos olhares dos gringos.

A leitura é rápida e divertida. Como fã do Porta dos Fundos, reconheci as esquetes de muitos vídeos os quais já tinha assistido. Já havia lido muitas das crônicas da Folha também, contudo a releitura foi divertida. Creio que o livro é indicado para todas as idades, de forma que somos incutidos sobre a reflexão, por meio de uma linguagem fácil e atual, do momento em que vivemos política, social e culturalmente. Somos investimos da consciência crítica através do humor. Um bom presente de Natal. Nota 8.